domingo, 17 de novembro de 2013

Matar ou morrer...

Passa a hora e o sono tarda, recordo agora que sou um velho o nervosismo do meu primeiro combate. 

Resumia-se a matar ou morrer, sobrevivência em estado bruto.

É instintivo nenhum ser humano quer morrer, ao longo de décadas vi centenas de mortes e em nenhuma senti uma resignação total, mesmo nos prisioneiros sacrificados ou nos moribundos o olhar transmitia sempre um desejo de prosseguir, de viver.

Apesar disso os nossos inimigos eram temerários, os Deuses do Norte abençoavam aqueles que morriam em batalha de arma em punho, mas mesmo estes não tinham muita pressa em festejar nos salões de Odin.

Reconheço que quando os vi avançar em direção ao nosso grupo tive medo. Eram homens robustos com longos cabelos e barbas vestidos na maioria com cabedal fervido e peles de animais, todos usando um escudo redondo e uns com espadas compridas e outros machados.

 Apenas o líder, um suevo enorme que seguia na frente tinha um elmo de ferro e uma cota de malha que descaia até ao joelho,remendada na zona do peito usava um machado enorme.

Parou à distancia do lançamento de um lança e presentou-nos com um sorriso desdentado.

- Procuram a morte porcos romanos? - rosnou num latim típico de um bárbaro habituado no passado a servir como auxiliar nas Legiões do Império.

Nenhum de nós respondeu, cerrámos a formação e batemos com as espadas nos escudos mostrando estar prontos para matar ou morrer.

- Cães chamo-me Aguilfo e vou matar-vos a todos - vociferou o enorme suevo fazendo um gesto com o machado para os seus homens avançarem.

Os bárbaros estavam habituados a vencer, sobretudo em campo aberto, esperavam que a nossa formação se desintegrasse devido ao medo e em seguida usariam as suas armas para nos abaterem como gado.

Mas aguentamos, o medo nem sempre leva à fuga, o medo por vezes faz com que as pessoas se unam e sob a liderança de António e Daerlig sustivemos o ímpeto do inimigo.

Os primeiros homens vacilaram ao sentirem que a nossa muralha de escudos não se desmoronou, o que era para ser uma matança fácil tornou-se uma luta encarniçada.


Senti um machado a bater no meu escudo tentando quebrar a formação para permitir aos guerreiros que vinham atrás penetrar e romper a nossa linha. 


Aguentei, esqueci o medo, o rosto do inimigo estava próximo do meu, sentia a sua respiração bafienta, olhos vermelhos do álcool, o suor, uma cicatriz que descia do nariz ao queixo. Sobretudo recordo a forma como o abati.

O gládio romano sempre foi a melhor arma para o choque de escudos, o espaço é exíguo, manobrar um enorme machado de guerra ou uma espada é difícil senão em muitos casos impossível.  

Era a arma que possuía no momento e instintivamente usei a usado toda a minha força com o escudo para desequilibrar o suevo e espetar o gládio no estômago perfurando com ímpeto de forma a atingir um orgão vital.

Ao expor o meu flanco a minha sobrevivência dependia do homem que estava ao meu lado e Daerlig usou o seu escudo para me proteger de algum golpe.

Ao golpear o inimigo senti o sangue a ensopar a minha mão e a sua expressão a passar de raiva para estupefacção até cambalear e cair aos meus pés. 

Sempre senti receio antes de um combate é normal sou humano, mas durante a escaramuça o receio transformava-se em calma numa fúria racional que me fazia ser temerário e ao mesmo tempo consciente

Em pouco tinha conhecido o amor e tinha morto o primeiro homem, uma parte de mim morreu naquela estrada junto ao rio.

A escaramuça corria a nosso favor a arrogância do inimigo tinha ditado a sua derrota. Vi Marco e António abaterem dois guerreiros com golpes certeiros, observei a queda de um soldado romano  abatido com um golpe de machado no crânio. 

Daerlig abateu três inimigos de rajada usando a sua espada com mestria e provocando a fuga do inimigo.


Tínhamos perdido apenas um homem e abatido seis inimigos. A perseguição era inútil, infelizmente nenhum suevos abatidos era Aguilfo. 

Este tinha fugido com os restantes guerreiros para norte, procurando juntarem-se a outro grupo de pilhagem suevo e avisar para a presença de alguns inimigos na estrada que seguia para Dipo.


Daerlig e António procuraram-me sorrindo pela minha primeira morte.

- Pensei que ias fugir romano - disse Daerlig enquanto limpava a espada - sorri perante a sua calma.

- Pensei nisso mas se tu ficaste saxão eu nunca poderia deixar-te à mercê dos teus primos suevos.

António deu-me uma palmada nas costas rindo mas logo o seu semblante mudou quando um dos soldados o procurou.

- Senhor um deles ainda respira - disse o soldado apontando para uma árvore onde um jovem estava sentado com ar combalido.

- Décimus, Daerlig um dos cães ainda vive vamos tentar saber novas da invasão-  fomos os três falar com o inimigo enquanto os restantes soldados pilhavam as armas dos guerreiros abatidos.


















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