Entrei no aeroporto de Lisboa, respirei fundo, olhei para trás, tinha de partir. Sou impulsivo, podia viver mais mil anos que para o bem ou o mal seria assim.
Levava comigo duas malas, uma cheia de roupa e a outra de livros. Fiz o check in, sorri para hospedeira de terra, ela retribuiu, afinal estou vivo.
Sentei-me num dos cafés do aeroporto, pedi um café longo, olhei para o telemóvel, nada, melhor assim.
Tinha de fazer tempo até ao embarque, folhei o jornal, observei as pessoas que gravitavam naquela zona.
Foquei-me num casal jovem, apaixonado, ambos sorriam e trocavam prolongados beijos. Dei por mim a sorrir, era isso o que eu queria da vida, sorrir constantemente.
Acordei do meu "sonho" com uma voz feminina, falava português com sotaque.
- Olá, as mesas estão todas ocupadas, posso sentar-me? - pelo sotaque era inglesa.
- Claro que pode, faça favor - respondi usando o meu formalismo pouco sexy.
- Obrigado sou a Heather, desculpa o meu mau português - usou um sorriso genuíno.
Ela era jovem, na casa dos trinta, loira, pele clara, olhos esverdeados, elegante, mas foi no sorriso que me concentrei.
- Hi Heather - sorri também - Sou o João ou se preferires John.
- John João ehehehe - disse a rir.
- Pode ser, vais para onde? - concentrei-me nos pormenores, usava uns jeans rasgados no joelho, uns ténis da moda e uma camisa de ganga clara.
- Estas a olhar para mim João ? - apanhado pensei eu - Não nada disso estava apenas a reparar que tinhas uma camisa muito bonita - retorqui num tom jovial
Ambos rimos, fazia tempo que não me sentia assim leve, sem fantasmas, duas pessoas só...
- Vou para Londres, estive em trabalho em Lisboa, agora regresso e tu?
- Vou viver para o País de Gales, aceitei uma proposta de trabalho, vou trabalhar para uma financeira.
- Nice, ops, que bom e queres ser meu amigo John? - Claro que sim, a minha primeira amiga inglesa.
O mundo é um mar de coincidências, embarcamos no mesmo voo, lugares diferentes mas com poder de persuasão conseguimos trocar lugares e ficar juntos.
Senti-me bem, a conversa fluía, foram três horas onde falámos de história, de nós, do mundo, de expetativas.
Falámos de comida, de música, de viagens, ficou prometido um passeio pelo Alentejo, uma ida a Almourol, um cruzeiro no Douro, uma ida Cornualha, a muralha de Adriano, falamos de tudo e de nada.
Chegámos a Londres, eu tinha o tempo cronometrado para apanhar o comboio para Cardif, trocamos números de telefone e moradas.
- Adeus Heather, vou ter saudades - Saudades? what? - disse ela a rir e agarrou-me o meu corpo envolvendo-me num abraço forte, intenso e beijou ao leve os meus lábios, demasiado leve.
- Miss you João - partiu fiquei um minuto parado, suou a uma eternidade.
Segui para a estação pensativo, tinha-me esquecido de ligar a dizer que estava bem, olhei para o visor do telemóvel.
"Se voltasses atrás no tempo tentavas mudar algo? Eu sim... beijo"
Irónico, demasiado tarde, demasiado sofrimento, quando abri o meu coração, expus-me ao limite das minhas forças, fui rejeitado.
"Tu escolheste o presente...beijo se feliz"
Suspirei tinha um comboio para apanhar, uma vida nova a começar, o sorriso da Heather, meti os phones e ouvi...
“Bebi” tudo o que estava no
horizonte do trajeto do comboio. A paisagem que desde muito sonhava observar,
tinha tanto para ver, os meus heróis de juventude todos eles tinham pisado,
amado, sofrido naquele solo.
Planos não faltavam para ocupar o
meu tempo livre, sentia-me livre, um adolescente trintão a viver uma segunda
vida. Os rios, os campos, as ruínas, os livros de Bernard Cornwell e Simon
Scarrow.
E a Heather, pensava nela, mas na
verdade eu precisava de respirar, não de me voltar a sufocar na teia da paixão.
Na verdade estava carente, mas
lúcido, aprendemos sempre com o que sofremos no passado e a Inês tinha-me
magoado.
Pensei friamente, iria
divertir-me, sexo, brincadeira, algo leve. Provavelmente era o que ela queria,
amor a primeira vista, acreditei, senti, mas já não mais para esse peditório.
A minha boca tinha saudades de
beijar, de calor. Não sou perfeito, precisava de ser desejado.
Liguei para um amigo.
- Então bofia maluco, tudo bem? –
do outro lado responde-me uma voz rouca.
- Então miúdo, estas a gostar
disso? As gajas? – não pude deixar de sorrir, teria de aprender a ser como ele,
para bem da minha sanidade mental.
- Por acaso conheci uma, chama-se
Heather, uma loira inglesa, gira e simpática.
- Sacaste o número? – disse de
forma quase a soar a repreensão se a resposta fosse negativa.
- Ando a aprender umas merdas
contigo, sim saquei, acho que podemos ser bons amigos – Amigos? Bah não sejas
urso, ainda agora aterraste, tens um vasto mercado para explorar.
- Eheheh, tens razão, tens razão –
ele no fundo tinha razão e eu estava decidido a ser um cabrão frio.
- Daqui a um mês vou ter férias,
vou ver-te, vê se conheces umas malucas para me apresentares, agora vou ter de
ir trabalhar, abraço.
- Abraço pá, vou dando notícias
do fantástico País de Gales.
Custa sempre despedir do nosso
melhor amigo, mas sozinhos que encontramos o nosso rumo e equilíbrio, sem medos
de falhar, na verdade pior também não podia ficar.
Estava a meia hora do destino
quando recebi outra mensagem;
“ só tens isso para me dizer?”
Mas o que ela quer? Deixar-me
maluco? Não, não podia deixar isso acontecer, abri o meu coração em Lisboa, fiz
300km até as origens dela para apelar ao coração, ao sentimento.
Ela foi racional, optou pelo marido,
fez de mim a última escolha, o dispensável indispensável, no meu orgulho isso
era impossível.
E agora diz-me isto, respondi;
“Já te disse muita coisa no passado,
optaste, escolheste outro…”
Não lhe quis dar o “prazer” de
saber que quando me deitava a minha cabeça ficava a pensar nela sem fim mesmo
apesar da frieza que demonstrou em tantos momentos.
Esquece, esquece João, vida nova.
“Hi João eu penso em ti…”
Olha a Heather lembrou-se de mim.
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