sexta-feira, 15 de novembro de 2019

um conto parte VIII

Recolhemos as malas, rimos com a burocracia, com o toda a azafama, parecíamos duas crianças.

Entrámos num táxi, seguimos para um hotel no centro.

Era noite, as luzes, o barulho, tudo era abafado pelo olhar da Rita, sem dar conta estava a cometer mais um erro, ainda não tinha superado uma desilusão e caminhava novamente num trapézio sem rede.

Será atração pelo abismo, será masoquismo, não sei, apenas me sentia preenchido, encantado pela presença dela, tudo isto sem a ter tocado, beijado.

Estranha sensação de que a conhecia faz longos anos, de que tudo fluía,  o tempo voava na presença dela, quando o que que queria era perpetuar os momentos que vivia.

Sem angustia, sem necessidade de forçar nada, a empatia crescia com o tempo em que passávamos juntos.

Chegámos ao hotel, a lua poderosa iluminava a rua, paguei ao taxista e perguntei.

- Já decidiste? Um ou dois quartos?

- Vais fazer-me mal se dormir no mesmo quarto que tu? - respondeu ela maliciosamente

- Nunca - respondi com sinceridade

- Os teus olhos dizem o mesmo, são demasiado transparentes, partilhámos quarto, mas se apenas tiver  uma cama, dormes no chão - disse ela

- Ok, combinado! Mas se dormir no chão pagas tu o jantar.

E assim foi, o quarto era pequeno e apenas tinha uma cama e eu afirmei o compromisso assumido antes de entrarmos no hotel.

- Já vi que durmo no chão, mas o jantar fica por tua conta.

Depois de um duche reconfortante, vestimo-nos e partimos para as ruas em busca de refeição e uma bebida.

Estava uma noite quente, mas chovia ligeiramente, uma chuva quente, ela vestia uns jeans e uma t-shirt justa branca, que realçava o corpo, magro, com curvas, um corpo bonito, insinuante.

Quis dizer que ela era linda, que estava linda, que ofuscava a luz da cidade, que a sua presença ofuscava os milhares que circulavam pela rua.

Guardei para mim, caminhamos, dissemos banalidades, comemos num pequeno restaurante de rua e bebemos umas cervejas.

- Queres ir descansar, ou vamos dançar um pouco? - disse ela no fim da refeição.

Deixei o cansaço de lado e disse que sim,

Caminhamos mais um pouco pela cidade do pecado, corremos as ruas de Sukhumvit e parámos num bar que passava música dos anos 80.

Foi divertido, boa música, bebemos mais umas cervejas e a medida que a noite ia passando ambos nos íamos libertando mais um pouco.

A troca de olhares ganhava intensidade, uma cumplicidade estranha e boa, que mexe com tudo, que abala a nossa convicção e as nossas ideias.

O racional deixa de fazer sentido, tudo à volta desaparece, ficamos nós, a outra pessoa, a música de fundo e mais nada…

Enquanto tocava "Wicked Game" e dançávamos juntos, olhamo-nos nos olhos e a primeira frase foi dela.



- És bonito sabias - e riu-se, sentindo que me tinha desconcertado

Fiquei nervoso, bebi mais um pouco da cerveja e olhei novamente ela nos olhos.

- Pensei o mesmo de ti, ainda não tinha tido coragem para o dizer - afirmei.

Estranho destino que tinha colocado dois desconhecidos no mesmo trilho, juntos num bar numa cidade a milhares de km do seu país, a dançar olhos nos olhos.

continua…






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